"A verdade de outra pessoa não está no que ela te revela, mas naquilo que não pode revelar-te. Portanto, se quiseres compreendê-la, não escute o que ela diz, mas antes, o que ela não diz."
(Khalil Gibran)
É preciso saber ouvir os silêncios. Os meus, os seus, os nossos. Para quem não sabe: o silêncio tem som. O grande problema é que muitos não sabem ouvi-lo, seja por pavor ou ignorância. Então arrumam várias tarefas ao mesmo tempo, se escondem em músicas, filmes, livros, bocas. E, inconscientemente, vão se enganando.
Há um tempo atrás eu me enganava, preferia não ouvir o silêncio, a quietude me agitava e eu precisava de barulhos externos, pois os internos faziam rave dentro de mim. Não acabava pela manhã, era uma rave eterna. Um dia, não sei bem em que horário, resolvi tirar o sapato, pegar a minha bolsa e ir embora da festa. Tomei um banho (já percebeu que pensamos com mais transparência depois de limpos e perfumados?) e decidi: quero o meu silêncio. Liguei para ele e disse "vem pra cá, preciso de você". Fiz umas rosquinhas e um chá de morango e sentei, a fim de esperá-lo.
Depois de alguns minutos, lá estava ele. E ainda trouxe companhia: a paz. Mas a paz é um pouco tímida, demora para se sentir em casa, então chegou e ficou quieta, não quis conversar comigo. Ficamos, então, eu e o silêncio. Comecei a aprender coisas, compartilhamos momentos, passado, presente e pensamos a longo prazo, somos bem organizados, temos foco, nos preocupamos com o futuro. Dividi sentimentos, inquietações, arrombamentos emocionais, pois todos nós um dia fomos ou seremos ou somos furtados, roubados, lesados ou invadidos emocionalmente. Ele me ouviu atentamente, o silêncio é um bom amigo, além de fiel, pois nunca lhe vira as costas ou altera o tom de voz. Ele é calmo, manso, sereno, cuidadoso.
Depois de muito diálogo, abraços carinhosos, cafunés, risadas, recordações e planos, o silêncio conversou com a paz e disse que já era hora dela abrir a geladeira. Você sabe: nos sentimos realmente à vontade na casa de alguém quando abrimos a geladeira com a maior naturalidade do planeta. A paz levantou, caminhou passos vagarosos e abriu a porta da minha geladeira. Pegou uma garrafa de suco de laranja, procurou um copo, encheu, tomou e perguntou se eu queria um pouco. Aceitei, adoro suco de laranja. Sem gelo e sem sementes.
Ficamos lá, nós três: eu, o silêncio e a paz. E foi aí que começou um triângulo amoroso que, acredito eu, não terá fim. É preciso saber ouvir os silêncios. Os meus, os seus, os nossos. Para quem não sabe: o silêncio tem som. Descubra os acordes do seu.