Das coisas que aprendi

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Era pra ser ontem, se bem que a gente nunca respeita as datas. Na verdade uma data não diz nada, o que importa é o que existe por trás dela. Tanta gente abraça e beija falso no Natal, tanta gente diz feliz-aniversário-tudo-de-bom sem nem gostar da outra pessoa, é tudo tão fácil e simples que a gente sente todos os dias, não importa se é dia de festa ou um dia comum. Na verdade os nossos dias nem são comuns, na verdade eles são de verdade, o que vale é sentir de verdade e isso a gente sente todos os dias, mas igual eu resolvi te escrever hoje pra dizer as coisas que eu aprendi. Se eu esquecer de alguma coisa me lembra depois, não é que eu não tenha aprendido, você sabe que eu aprendo e esqueço e depois eu acabo lembrando de novo aquilo que tecnicamente eu havia esquecido. E fica tudo confuso assim, mas de verdade, verdade, verdade.
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Anteontem à noite nós vimos uma apresentação de ballet infantil e, tudo bem, não era só o infantil, também tinha gente grande, gente que nem a gente é. Mas a gente também é pequeno, porque a gente anda de balanço e a gente come besteirinha que criança gosta e de vez em quando, é verdade, verdade, a gente também faz birra e bico e fica com cara de bebê emburrado. Volta para a apresentação, você sabe que eu falo e emendo um assunto no outro e acabo nunca concluindo assunto algum, então você diz ei, continua contando aquele outro negócio e eu pergunto qual negócio e você me relembra as coisas. E eu comecei a entender mais a minha vida e os meus comportamentos e até mesmo os meus sonhos e eu digo: obrigada, muito obrigada por me fazer ver. Eu falava do ballet (você não está aqui pra me ajudar a recordar o lugar em que parei, então forço forçado a minha memória e até consigo voltar para o lugar de origem ou de pausa), você segurava a minha mão e a gente olhava para o palco. Eu preciso dizer que senti uma coisa tão boa, sabe, uma coisa boa mesmo enquanto a gente estava ali. Uma coisa simples dessas, sei que tem gente que nem dá bola, mas eu gosto tanto de ficar assim, fazendo tudo ou nada ou prestando atenção em qualquer coisa, um filme, uma peça, uma paisagem, assim, de mãos dadas, dá uma paz grande e ao mesmo tempo um sentimento doce, doce de doce mesmo. Então de vez em quando, de lado, discretamente eu ficava te olhando. E quanto mais eu te olhava mais eu sabia que eu tava olhando pra coisa mais importante da minha vida. Aquela hora em que todas as menininhas estavam ali dançando e a gente achando graça, elas eram pequenas e você sabe como é criança, criança tem luz, pureza, tudo o que é bonito e a gente ali sorrindo, até que a menina errou o passo. A menina errou e chorou, ela errou e eu chorei. A menina, pequena, uns sete anos no máximo, esqueceu a coreografia, se confundiu, errou, ficou nervosa, olhou para a mãe (que deve ter feito uma cara assustadoramente feia) e chorou, chorou sentida, chorou um choro triste. E eu chorei, de alguma forma compartilhei secretamente o erro do passo de dança, talvez porque eu erre alguns passos também.
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Você entende tanto o meu jeito de sentir que eu me sinto muito confortável pra chorar, de qualquer jeito, em qualquer hora ou lugar. É que eu sei que você é diferente das outras pessoas, não acha bobo se emocionar com uma coisa assim, pelo contrário, você entende e faz o que fez desde o primeiro dia, desde que a gente se conheceu: me abre os braços. Abre os braços bem abertos e me recebe com aquele abraço silencioso, forte, completo. Abre os braços e lá eu ganho o mundo, a minha cabeça encontra um abrigo, fica protegida de ventos fortes, chuvas fora de hora, sol que queima, garoa indesejada. Então você me aperta forte contra o seu peito e a gente fica assim. A gente fica inteiro, um todo, com a sensação de par que é um. Isso é indescritível.
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Ontem eu te abracei daquele jeito de sempre e percebi que você escondia o rosto no meu colo. Conheço a cena, você faz isso quando chora de alegre ou de triste. Porque temos muito em comum, inclusive isso. E eu me afastei um pouco e perguntei o que houve e você disse com a cara mais linda do mundo que não foi nada, que você tava feliz. Aí eu olhei pro seu olho lindo e tinha lá uma lágrima na diagonal, entortada, bonita, feliz. E fiquei feliz também, porque eu aprendi tanta, mas tanta coisa com você nos últimos oito meses que nem sei enumerar todas elas.
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De vez em quando eu fico assim, meio boba, do nada fico te olhando fazer coisas simples, como amarrar o tênis, escovar os dentes, mexer a panela, lavar o copo, arrumar a cama, trocar um cd, coçar o braço, caminhar na rua, abrir a janela, qualquer coisa, fico te olhando e eu sinto que o meu coração sorri. De feliz. De ter te encontrado, porque eu acredito que o amor pra ser assim, de verdade, verdade, verdade, ele é muito raro. E difícil de achar. E eu sou uma sortuda. Aquele dia em que você acordou e abriu o olho e mal abriu o olho me olhou e disse "eu te amo", foi a coisa mais bonita que já me falaram. Foi o eu-te-amo mais bonito do mundo, o mais lindo que você disse, o mais lindo de todos. E eu fico aqui me repetindo que é lindo e bonito e isso e aquilo, desculpa, é que não tenho outra palavra pra definir o quão belo foi. Porque foi tão natural, sincero, você tinha acabado de acordar e eu também e isso acontece sempre: eu acordo e você acorda e vice-versa, tudo ao mesmo tempo, até parece que a gente combina, é que nem os nossos gostos pra tudo, a gente combina em um bando de coisa, fora o tomate, que eu detesto. Mas faz bem pra próstata, eu entendo, homem precisa comer.
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A gente combina tanto que eu peço um presente que você já tinha planejado me dar. E a gente completa as frases e os pensamentos um do outro, nada disso é planejado, combinado, sai assim, ao natural, tão a gente, tão normal. Nada do que está escrito aqui é novidade. Você sabe, porque você sente. Nunca esquece de todas as coisas que são nossas, nem do que foi e é mais importante em tudo o que eu aprendi, que é te amar. Sempre e cada vez mais, se é que isso é possível.
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