Nunca gostei muito de energético, o gosto é ruim ao cubo. Puro, com refrigerante, suco ou um traguinho amigo, já bebi de tudo, acho o gosto ruim e ponto. Além disso, descobri: termina com ético. Apesar de me considerar uma pessoa ética, não curto muito o marido dela. Patético, poético, diurético, sintético, eclético. Se tem uma palavra que detesto, é essa: eclético. Quer coisa mais sem opinião?
Que tipo de música você curte? Ah, sei lá, gosto de tudo, sou bem eclética, vou do Pixote ao Pinback em minutos. Qual o seu filme preferido? Sou uma pessoa assim, bem eclética, gosto desde David Lynch até Jean-Luc Godard. Qual a sua preferência sexual? Putz, agora você me pegou, sou muito eclética, traço homem, mulher, travesti e qualquer coisa que se mova e pisque. Qual o seu estilo? Hum, difícil, sou eclética demais: às vezes tô na onda alternativa, em outros dias mais clássica. Qual lugar você costuma frequentar? Nossa, sou muito eclética, gosto de ir na Calçada da Fama, nos barzinhos da Cidade Baixa e no Rei do Bailão.
Etimologia: fr. éclectique (1732) 'nome que se dava a alguns filósofos antigos'; (1832) 'que não é exclusivo em seus gostos'.
Eclético, para mim, é como energético: tem gosto ruim. Não gosto de gente eclética. Na vida as coisas não precisam ser matemáticas ou extremamente bem definidas, se fosse assim perderia toda a graça. A mudança é importante, é sinal de crescimento e maturidade. Você pode se adaptar, renovar, evoluir. É saudável e necessário. Não gosto de gente que não sabe o que quer. Se você não sabe direito o que quer, saiba pelo menos o que não quer de jeito algum. Nem sempre sei o que quero, por isso às vezes não gosto de mim e sinto uma vontade danada de me esbofetear na frente do espelho. Mas sempre, sempre soube o que não quero para mim.
Eclético é quem não sabe o que quer, quem pega uma música aqui e outra ali e monta a sua trilha sonora. Acho bonito cada um separar o que quer para si, mas que então diga exatamente do que gosta. Que saiba os seus gostos, que se experimente, se descubra. Que não abra a boca para dizer que é eclético, como se isso fosse uma sentença, uma espécie de condenação alternativa, um consolo, uma moda. Já ouvi muita gente dizer que é eclética para se inserir em algum grupo, porque acha bonito dizer-se eclético. Eu acho uma grande piada. Opinião, porra! Não sou nada eclética, gosto de muitas coisas, acredite, mas tenho claro e seguro na minha mente o que eu gosto. E, principalmente, o que não suporto.
Gosto de homem, panqueca, cachorro, sol. Também gosto de dias nublados e uma chuvinha, mas isso é só quando estou em casa. Gosto de gente, mas preciso da minha solidão pra jogar cartas comigo mesma. Não gosto de rave, pagode, música eletrônica e modismos. Gosto de chiclete, de água com bolinhas, de cheiro de livro, de andar de meias. Eu gosto de uma coisa aqui e outra ali, mas não me defino como eclética. Eu nem me defino, isso é impossível. Mudo o tempo inteiro, apesar de manter sempre a essência, que não é eclética. Acho importante ter a cabeça (e especialmente os olhos) abertos para enxergar além, para receber tudo o que a vida indiretamente mostra. Às vezes ela é bem cara de pau, esfrega coisas no nosso nariz. O problema está na etimologia: "que não é exclusivo em seus gostos". Já descobri o que me incomoda, só pode ser isso. Eu gosto de diversas coisas ao mesmo tempo, mas consigo ser exclusiva em todas, porque sou exclusiva comigo mesma. Os ecléticos, eu aposto, não são.
