Eu quero viver de palavras

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Eu adoraria que me perguntassem como eu quero viver. Pena que ninguém pergunta. Tudo bem, sigo vivendo, não tem nenhum problema - ou tem, mas a gente dá um jeito. Já que ninguém pergunta eu respondo mesmo assim: eu quero viver de palavras. Não importa se são bonitas, feias, mais ou menos. Não faz mal se elas sofreram algum aborto e não chegaram a nascer. O que vale, aqui, é a intenção e a vontade.
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Escrever é um processo muito solitário. A gente escreve, publica ou deixa em um canto. Um dia, querendo ou não, aquele texto cruza novamente o nosso caminho. É preciso encará-lo de frente, sem medo. Uma afinada aqui, uma puxadinha ali. O texto se renova, fica com outra cara, ganha mais vida e as ruguinhas vão sumindo. Textos, às vezes, precisam de Renew. Potes e potes. Mas o resultado é surpreendente.
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A hora de escrever é uma mistura de tudo: roubo, sonho, magia, suor, invenção, sequestro, alucinação. Escrever alucina. Quem escreve precisa ser um pouco esquizofrênico na hora em que está criando. Ou então na hora em que a alucinação corre atrás de você. Geralmente é na hora do banho, vendo um filme, lendo uma revista, falando ao telefone. É por isso que ando com muitos bloquinhos. E deve ser por isso, contei ontem, que tenho cinco canetas dentro da bolsa.
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Dói. Escrever dói. Faz rir, claro que sim. Mas machuca. A gente se depara com coisas que não queria, tem que enfrentar uns fantasmas que teimam em não ir embora. O papel serve de espelho, consolo, apego, inferno. A tela, por vezes, estende a mão - quando está de bom humor. Mas quando ela acorda rebelde, prepare-se: ela tenta de todas as formas te estrangular. Escrever é sentir o coração na ponta dos dedos. É entender que de vez em quando eles têm vida própria, não dependem de nós, escritores descontrolados e insaciáveis, que sempre queremos dominar as frases e colocar nos trilhos os pensamentos.
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Escrever - digo de novo - é um processo solitário. Você escreve e escreve e escreve e decide montar um livro. Entrega para outros escritores, consultores literários, pessoas que você confia. Todas fazem aquele gesto afirmativo. Sim, publica. Sim, vai ser sucesso. E então ele, o medo, que surge querendo arrancar as suas unhas, mas você dá de ombros e pensa que é mais forte que tudo. Vai atrás de editoras. Elas batem a porta na sua cara, dizem que lerão no prazo de seis meses, demoram a dar um retorno. Você desanima, pensa em desistir. Lê novamente o livro, organiza de outra forma. Reescreve, corta, aumenta, ajeita, apaga, rabisca, constrói. Faz um novo livro. E aposta - com fé e dedos cruzados - o que tem. Algum tempo depois, em uma tarde qualquer, uma tremedeira invade o seu corpo, moleza, emoção, felicidade que sai pelas orelhas: uma editora diz sim, eu te publico. Você, não acreditando, diz hein?!?
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E foi assim. Agora que o contrato está assinado posso dar a notícia aqui, para vocês que acreditam, que pedem, que me escrevem, que me mandam esse carinho bom. Entre julho e agosto o meu livro vai ser publicado, gente. É mais provável que seja em agosto. Fiquei orgulhosa de mim porque publicar hoje em dia é bem difícil. Novos autores, em geral, precisam pagar a primeira publicação, pedir algum patrocínio, fazer vaquinha, dar três pulinhos, fazer novena, apelar para leis de incentivo. Não precisei de nada disso. Não tenho como dizer para vocês o quanto estou feliz, mas acreditem: é muito. E devo muito a todo mundo que fez com que eu não desistisse. Obrigada. A gente nunca deve deixar de acreditar.

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