Com quase trinta anos, a gente começa a ver o rosto de forma diferente. Um sorriso fora de hora refletido no espelho mostra uma marca que pensa que o nosso rosto é abrigo. A testa contrai na ida e na volta fica um pouco amassada tipo aquelas mantas de sofá que alguém sentou, bagunçou e esqueceu de arrumar na hora de levantar. Para combater os fios brancos (que podem ou não aparecer), a farmácia e os salões de beleza oferecem um verdadeiro arsenal. Tonalizante, tinta, disfarçador capilar, vale tudo na hora de encurtar os defeitos especiais da idade.
Alguém dirá que é bonito envelhecer, eu também acho. Mas a idade me assusta. Pensar que um dia os meus fios dourados serão brancos, também. Imaginar que meu rosto ficará feito uma fruta murcha, mais ainda. Com quase trinta anos a gente percebe que as costas ficam doendo depois de uma tarde mal sentada. Os pés também. Os braços também. As pernas também. Tudo também. Pertinho dos trinta a gente se dá conta que demora muito mais pra se curar de uma noitada. A ressaca não passa tomando Coca Zero e Neosaldina.
Com quase trinta anos, sinceramente, a gente cansa de amores de apenas uma madrugada. Aos quinze, tudo é festa. Aos vinte, tudo é festa. Aos vinte e cinco, tudo é festa. Aos trinta, tudo é sossego. Hora de pensar na decoração da casa, no rumo da carreira, no que pretende do relacionamento, se é que você tem um. Se não tem, oh céus, mulher com trinta anos solteira é um perigo! Solteira, hein? Apesar da evolução da espécie, mulher solteira é vista como infelizona. Imagina, coitada, sem um homem, completamente sozinha?!?
Aos trinta anos, a gente reflete. Se auto-questiona, se auto-responde. Aos vinte e poucos você ainda pode se dar ao luxo de cometer abobadices sem ser rotulada de irresponsável, afinal, você tem vinte e tantos, vinte e muitos. Os trinta parecem um peso, você precisa ser A Adulta Responsável e você tem que casar e ter um filho. Não que precise casar com trinta cravadinho, mas você tem que pelo menos pensar nisso, poxa, com trinta, passando dos trinta, tem que vislumbrar o vestido branco. Indiretamente todos te cobram, silenciosos, um papel, um véu, um babeiro, uma fralda. Pra ser feliz, minha amiga, case, trabalhe e tenha um filho. Do contrário você será uma sem-ninguém-sem-valor.
Quase balzaca, você percebe que a lei da gravidade existe. Tudo começa a querer ficar perto do chão. Você demora mais pra perder peso, pra ganhar músculo, o metabolismo começa a descer a ladeira - de skate. Com quase trinta, você opta, seleciona. Prefere a comodidade, o conforto. Prefere assistir a um show sentada do que em pé. Prefere um sapato que não doa o pé. Prefere andar com gente que tenha algo a acrescentar. Prefere usar melhor o tempo, estar ao lado de quem vale mesmo a pena.
Com quase trinta, você tenta descobrir o seu papel no mundo. Fica um pouco assustada, mas reconhece o seu valor. Descobre que não tem que provar nada pra ninguém, muito menos pra você mesma. Com quase trinta você não tem mais saco pra falar bobagens ao telefone, passar a noite em claro chorando pelo bonitão da vez. Com quase trinta você decide sofrer apenas pelo que merece ser sofrido. E chega. Porque com quase trinta você descobre que as lágrimas de hoje serão as rugas de amanhã.
(Bate na madeira aí!)