Estrelas, borboletas e café quentinho

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Ilustração: Amélie Poulain, uma das lindezas da Jana Magalhães







Não adianta, já me convenci. Entra ano, sai ano, mudo um pouco. Algumas marquinhas na volta dos olhos surgem na hora de um sorriso. Pequenas manchas do sol tomam conta dos meus braços. Entendo que um corpo de vinte e nove não seja tão jovem quanto um de vinte e oito. Me sinto à vontade com a bagagem que a vida vai colocando, mesmo sem ser convidada, dentro dos meus armários internos. Gavetas ficam lotadas, prateleiras enchem, cabides suportam mais de uma peça de roupa. Mas meu rosto, se você olhar com cuidado, é praticamente o mesmo de quando eu tinha dois anos de idade. Os mesmos traços, os mesmos olhos grandes que brilham na frente de uma coisa bonita, a mesma boca colorida, as mesmas sardas, o mesmo tudo. Meu coração, ainda infantil, não entende os ciclos que a vida tem: acha que tudo é belo e puro.

Aprendi que a gente não precisa ter medo de mudar. E mais: o crescimento chega lado a lado com as mudanças. Sei que existem pessoas de coração vazio, mas prefiro não pensar nelas. Meu jeito libriano gosta de ver a vida bonita. Gosto de perfume e dias simpáticos, prefiro o sol do que a chuva, mas consigo ver a beleza de um dia cinza. Ah, quer saber? Eu gosto é dos dias, não importa muito que cor eles tenham. Tudo está aí dentro de você, de mim, tudo é nosso. Só não me venha com conversa mole, não gosto. Nunca gostei de nada mole: gelatina, abraço, aquelas balinhas nojentas que não descem direito pela garganta, de tão molengas que são. E mais: sentimento tem que ser duro. É verdade. Não confunda dureza com aspereza. O sentimento, pra permanecer, precisa ser duro, inquebrável, resistente. Sou apaixonada por sentimentos, bolsas, esmaltes, sapatos, cremes, estrelas, borboletas e café quentinho.

Descobri que meu jeito nunca muda. Vou ser assim sempre, vou me dar, vou tentar aprender, mas olha, no fundo eu não aprendo nada disso. Não gosto de grades no coração, deixo ele solto. Por isso, ele se perde, foge, se esconde, grita, pede ajuda, volta. Ele tem uma boca tão grande que às vezes me engole, me suga pra dentro dele. Meu coração me prende e diz daqui-você-não-sai-sua-louca. Nem sempre entendo meus gestos, me sinto confusa no meio de tanto querer. Porque, meu amigo, eu quero sempre mais da vida. Talvez seja por isso que eu segure forte a mão dele, pra mostrar que apesar da gente se enganar e derrapar tanto, estamos juntos, colados, unidos. Eu e ele. Porque só meu coração, de fato, me entende.







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