Admiro quem sabe lidar com mudanças. Sou um pouco resistente, preciso de um tempo para me adaptar, conseguir me sentir em casa, ficar em paz. Nem sempre consigo, é bem verdade, nunca consigo relaxar completamente. Me sinto presa, meus ombros ficam tensos, não consigo deixar os músculos soltinhos, aliviar a mente e o corpo dos problemas. Tem coisa que fica rondando a minha cabeça que nem guarda noturno.
Os últimos tempos foram difíceis. Tive um problema de saúde e, junto com ele, muitas descobertas. É impressionante como a gente está sempre se descobrindo, refletindo, amadurecendo. A gente nasce e morre um pouco todos os dias, de tantas coisas que vivenciamos, tantos medos que enfrentamos, tantos traumas que superamos, tantas guerras que perdemos. É uma loucura viver e ter a consciência de que somos tudo e nada.
Finalmente fiz 30 anos. Eu sempre tive uma sensação de que não viveria até os 30. Que não passaria por eles, que não ultrapassaria essa Porta Para a Vida Adulta. Porque com 30 você finalmente é adulto. Não tem mais vinte e poucos, nem vinte e muitos. É 30. Não é mais criança, não pode se dar ao luxo de ser imaturo e de chorar de medo. A vida te cobra, ei, agora você tem 30 anos, seca essa lágrima, engole esse choro e seja mulher. Finalmente você tem 30, então se quer ter filho, acelera, vai pensando, planejando, pois com 35 começa a ficar passada. É assim, não adianta. Com 30 anos, surgem os cremes anti-idade (antiidade?). Com os 30, você precisa cuidar com a Lei da Gravidade. Com os 30, você não pode fazer besteira. A sociedade diz que a gente é adulta, por isso precisamos nos comportar como tal.
Quase pirei antes de fazer 30 anos. Um humor azedo me acompanhou. Um medo absurdo fez parte de mim. E se eu não der conta? E se realmente eu morrer? E se nada der certo? Fiquei louca de medo. Digo para você com t-o-d-a-s as letras: fiquei ca-ga-da de medo. Medo. Essa palavra tem me acompanhado desde que eu descobri que minha pressão estava lá em cima. Um belo dia eu fui ao médico, ele mediu minha pressão e ela estava 18 por 10. Eu pensei que ia morrer, imediatamente relacionei a pressão alta com morte, já que meu avô teve um infarte e minha avó um AVC. Então, desenvolvi, apareceu, surgiu ou sei lá o que aconteceu, só sei que ela veio: síndrome do pânico. Quem já teve ou conhece alguém que teve sabe bem o que é isso. Eu não tomava banho sozinha. Não conseguia ficar um segundo sem ninguém. A todo momento achava que ia morrer, sentia a garganta fechando, o coração disparando, suava frio. Lugares cheios me davam agonia, me dava vontade de sair correndo. Aos poucos foi passando. Aos poucos fui tratando. Aos poucos fui tentando me dominar. Fui ao cardiologista, ele disse que minha saúde está boa. Estou tomando remédio, espero que temporariamente, para a pressão. Também fui ao psiquiatra, mas não gostei muito dele. Falou coisas que não concordo, então resolvi tentar dominar meus pensamentos. Não é muito fácil, ainda mais para uma pessoa como eu, que pensa demais. Mas tô tentando. Confesso que o que estava agravando o pânico era a proximidade do meu aniversário. Os 30 estavam perto e, com ele, aquela sensação de que não iria viver. Para agravar, teve essa história da pressão alta. Achava que ia morrer de infarte ou algo assim. Mas vi que era bobagem, afinal, estou aqui, vivinha da Silva. Mas deu medo. Medo. Medo. Medo. Ele. A gente sente tanto medo ao longo da vida, já percebeu? Medo de viver. Medo de morrer. Medo de lagartixa. Nunca tive medo de viver. De morrer, sim. De amar, também. De encarar as coisas, também.
Minha vida mudou muito nos últimos anos. Eu mudei muito nos últimos anos. Mudei sem oferecer a menor resistência. Mudei sem me surpreender com as mudanças. Elas simplesmente apareceram, aconteceram, me invadiram e se instalaram. Então, eu finalmente me senti em casa dentro de mim mesma. E hoje, mais do que nunca, sinto que não devo nada para ninguém. A gente demora demais para se livrar de pesos e culpas. Mas um dia, finalmente, a gente acorda. E descobre que tem uma vida inteirinha pela frente.