Ele me mudou tanto. Não consigo entender exatamente onde as
mudanças começaram. Mas foram muitas. E acho que foi devagar. Se fosse rápido
eu teria sentido. E talvez tivesse pisado forte no freio. Ninguém gosta de
mudança, já que toda mudança implica uma perda. Quando a gente muda acaba
saindo da zona de conforto. E a zona de conforto é, como o próprio nome diz, confortável,
segura, boa.
Ele me deixou mais forte. A gente nunca percebe a força que
tem até acontecer algo. E quando esse algo acontece, plim, surge aquela força
absurda. E a gente se surpreende com as reações, pensamentos, sensações.
Ele me levou algumas pessoas. Poxa, eu lamento dizer isso,
mas ninguém é eterno. E sabe aquele seu amigo muito amigo? Ele vai te deixar
chateado. E sabe aquela pessoa incrível que você contava? Ela vai te
decepcionar. E sabe aquela colega que almoçava todas as quartas junto com você?
Ela vai passar a almoçar com outra pessoa depois que uma de vocês mudar de
emprego. A vida é assim: traz algumas pessoas e afasta outras.
Ele me mostrou o que é um sentimento. É que nem sempre a
gente sabe. Às vezes é necessário um empurrãozinho. Um beliscão. Uma queda ou
um peteleco na orelha. A coisa está ali, ao seu lado, e nem sempre os seus
olhos estão bem abertos para enxergar.
Ele me ensinou que os dias nem sempre são ensolarados. E que
a chuva tem a sua beleza. O cinza também. E que nada é eterno. E que ninguém
ganha sempre. E que esse é o grande barato de tudo. Essa inconstância, essa
incerteza, essa interrogação.
Ele me fez ver que a beleza vai além de um salto alto, uma
sombra preta, uma chapinha e unhas bem feitas. E que dinheiro não compra
caráter. E que educação não está em nenhuma prateleira do supermercado.
Ele me fez acreditar que tudo passa. Que nenhuma dor é para
sempre. Que nenhuma alegria dura 365 dias. Que a gente vive numa gangorra. E que
o ditado “um dia é da caça, o outro do caçador” é a coisa mais verdadeira que
existe.
Ele me deixou enciumada. É que todo mundo sabe quem ele é. Todo
mundo já sentiu os efeitos que ele traz. Todo mundo já provou o seu sabor. E já
se jogou em seus braços.
Ele, o tempo.